Supertoscano – A legislação se curva à inovação

Você sabe o que significa “Supertoscano”? Que título é esse dado a alguns vinhos italianos de elevada qualidade e geralmente caros?

Tudo começou por volta do fim da década de 60, quando a produção de vinhos italianos não passava por períodos gloriosos. A situação era difícil para os produtores que assistiam o declínio do prestígio de seus vinhos. Não somente pelas difíceis condições econômicas pós filoxera (praga das videiras), mas também pelos desacordos entre agricultores e proprietários de fazendas. A agricultura era muito diversificada em pequenas áreas. Não havia investimentos nos vinhedos e os produtores sentiam-se presos a rigidez da legislação de uma região extremamente tradicionalista. Para se produzir o vinho tinto Chianti não era permitido o emprego de uvas que não fossem daquela região. Era obrigatório o emprego de 70% da uva tinta Sangiovese, 15% da tinta Canaiolo, 10% da branca Malvasia e 5% de outras castas locais. O Chianti era um vinho clarinho, de pouco corpo e sem muita expressão. Para piorar as perspectivas vitivinícolas, as safras do início dos anos 70 apresentaram muito baixa qualidade e forçaram a indústria do vinho italiano imergir numa situação de verdadeira crise.

O Chianti estava desprestigiado. A situação bastante complicada cobrava dos produtores atitudes imediatas para a reconquista da excelência de seus vinhos. O mercado buscava outras fontes de qualidade e a concorrência crescia acirrada e assistia os vinhos italianos a assumirem posições cada vez mais desconfortáveis.

Mas…    assim diz o poeta: “Quem sabe faz a hora não espera acontecer”.

O talento, a competência, a obra prima que marcou o renascimento dos vinhos italianos teve autoria do Marquês Piero Antinori. Ele havia assumido os negócios da família em 1966 e seguia uma tradição rígida secular. O caráter inovador fez a diferença. Dedicou seu trabalho em prol do resgate da qualidade e estabeleceu novos rumos na vitivinicultura toscana. Não se limitou a trabalhar de acordo com as normas estabelecidas. Alterou a forma de plantio, trouxe mudas europeias e expandiu os vinhedos com castas como Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc, Merlot, Pinot Noir entre outras. Modernizou os processos de vinificação com ajuda do enólogo Giacomo Tachis e passou a produzir seus vinhos sob nova postura.

Por ter rompido com a legislação que normatizava a produção do vinho Chianti e devido às inovações adotadas, a denominação “Chianti” não pode ser ostentada nos rótulos dos vinhos de Pietro. Ele estava convicto e não se importou. Acatou a classificação mais simples para seus vinhos, enquadrando-se, assim, como “Vino da Távola” ou vinho de mesa, menção mais baixa dos vinhos italianos, ou seja, vinho comum.

Outros produtores também trabalhavam com os mesmos objetivos, ou seja, abandonavam as normas de produção do Chianti em busca do aprimoramento da qualidade de seus vinhos. Uma nova geração de vitivinicultores despontava.

A resposta se concretizou com absoluto sucesso. Assim nascia um dos melhores vinhos do mundo: o Tignanello, da Vinícola Marchesi Antinori.

Em seguida, outros grandes vinhos foram elaborados nos mesmos moldes, como o Sassicaia, da Tenuta di San Guido.

Há controvérsias quanto à data de produção de ambos. Mas a grande maioria das fontes indica que o Tignanello marca o início da produção dos “fora da lei”.

Esses vinhos agradaram muita gente não só da Itália, mas de muitos países. Porém, não podiam ser rotulados com as denominações italianas. Foi aí que surgiu a expressão SUPERTOSCANO, criada por americanos e ingleses para se referirem aos grandes vinhos, de alta qualidade da região da Toscana. Embora, ostentassem na época, pela legislação italiana, simplesmente o título “vino da tavola”.

 

Os reconhecimentos vinham de todas as partes do mundo. A revista inglesa Decanter elegeu um Supertoscano em 1979, o Sassicaia como o melhor entre vários países. Os vinhos italianos reconquistavam o topo da pirâmide.

A revista americana Wine Spectator, elegeu outro, no ano de 2000 o vinho Solaia 1997, de Piero Antinori o melhor do mundo naquele ano. No ano seguinte, em 2001, foi eleito o vinho Ornellaia 1998, outro Supertoscano da Tenuta dell’Ornellaia, de Ludovico Antinori, irmão de Piero.

 

Devido ao grande sucesso e prestígio alcançado pelos Supertoscanos, o governo italiano admitiu e foi forçado a alterar a legislação de produção do Chianti. Entre elas, deixou de exigir uvas brancas para produção deste vinho e permitiu o envelhecimento em barricas de carvalho.

 

Hoje, existem vários tipos de vinho Chianti. Os melhores são os Chianti Classico Riserva, quando elaborados pelos melhores produtores, são vinhos elegantes, saborosos e equilibrados. Os produtores membros do consórcio do Chianti Clássico usam como símbolo um galo preto, o emblemático “gallo nero”.

 

A qualidade dos vinhos de todas as regiões da Itália é reconhecida por todo planeta.

Mas é necessário ressaltar que tudo isso foi gerado por um momento de crise. Assim acontecem grandes inovações, as conquistas e as vitórias inéditas.

É como disse Charles Chaplin: “O valor de um homem não se dá pelas roupas ou bens que possui e sim pelo caráter e beleza dos seus ideais”.

Um brinde àqueles que acreditam!!

Aos que fazem a diferença para o mundo do vinho!!


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