As falsificações sempre existiram. Nos dias atuais, esta situação não é diferente. Espertalhões existem em todos os lugares, em todas as cidades e países. Eles se aproveitam do sucesso de qualquer produto que provoque uma determinada demanda para agirem. No mundo do vinho isso também não é novidade.
Há algum tempo, por volta do século XVIII, quando o vinho do Porto estava no apogeu, no “top do sucesso”, um produto almejado por muitos consumidores e tido como um dos principais das exportações portuguesas, começou a conquistar também, os olhares entusiastas dos falsificadores. Não demorou a entrar no mercado, grande quantidade de falsificações e bebida adulterada.
Com certeza, essa situação acabou afetando negativamente o mercado. Primeiramente, pela queda vertiginosa nas vendas da bebida. Alguns consumidores e apreciadores do verdadeiro vinho do Porto perceberam que estavam adquirindo produtos falsificados, ruins e de qualidade muito abaixo dos fortificados vinhos verdadeiros de origem. A outra questão é que gerou uma grande insegurança a aquisição do verdadeiro vinho, pois a dúvida na hora da compra era enorme, tendo em vista que era difícil distinguir a veracidade do produto, ou seja, fazer a distinção entre o original e o vinho falsificado no ato da compra. Muitos comerciantes revendiam os produtos sem saber que eram falsos, pois os adquiriram na garantia da originalidade para revenda e distribuição e quem os degustava, acreditava na queda da qualidade e optava por outras marcas, ficando assim, denegrida a qualidade tão elevada dos vinhos do Porto.
Assim sendo, diante de um cenário no mínimo preocupante, por volta do ano de 1757, o Marquês de Pombal (aquele mesmo que cansamos de encontrar nos nossos livros de história), na época Ministro de Estado de Portugal, adotou uma forma de controlar e garantir a veracidade de origem dos vinhos do Porto. Mais tarde, teve origem a sigla DOC – Denominação de Origem Controlada. Foi uma estratégia para garantir que o vinho foi produzido naquela região específica, entre outras formas de controle. A região do Douro, foi a primeira a receber a demarcação de Controle de Origem. Essa estratégia teve impacto extremamente positivo não só para os lusitanos, mas para todos os apreciadores e beneficiou, imensamente, a reconquista do mercado dos vinhos do Porto.
Hoje, a classificação DOC – Denominação de Origem Controlada – é utilizada para conceder normas de produção em regiões geograficamente demarcadas e determinadas por cada país individualmente. A certificação DOC além de garantia de origem estabelece os métodos de vinificação.
Fique atento quanto às siglas DOC, DOCG, IGT no caso da Itália, AOC na França, entre outras impressas nos rótulos dos vinhos e alguns alimentos, porque elas NÃO expressam a garantia da qualidade do produto, mas uma garantia de procedência e proteção da reputação de seus produtos.
São muitas as denominações de origem e cada país pode adotar uma nomenclatura. Existem muitos países em que as nomenclaturas variam dentro de suas regiões.
No caso da França que é produtora do maior número de vinhos finos do mundo, ela se dá ao luxo de possuir um minucioso sistema próprio que regionaliza e controla a elaboração de seus vinhos. Foi criado aproximadamente em meados da década de 1930 e foi denominado de Appellation d’Origine Contrôlée (AOC). Mas podemos observar que estes controles são regionais, não são adotados uniformemente em todo o país. Um exemplo claro é o caso de Bordeaux, onde cada sub-região tem sua classificação e terminologia próprias.
A Itália adota um sistema de nomenclatura muito parecida com a francesa, mas com pequenas diferenças. As regiões italianas, que também buscam constantemente aprimorar a qualidade de seus vinhos, criaram em 1980 a denominação DOCG – Denominação de Origem Controlada e Garantida. Depois, em 1992 implantaram a denominação IGT – Indicação Geográfica Típica. No caso das denominações italianas, é importante ressaltar que as IGTs não existem somente para vinhos. Elas são utilizadas também em alimentos e alguns outros produtos.
A Espanha também tomou como modelo suas indicações geográficas da França e implantou as primeiras Denominações de Origem – DOs em 1932. Estas denominações foram atualizadas e revisadas em 1970.
O nosso querido Brasil iniciou o extenso caminho do reconhecimento e da certificação de suas regiões produtoras e de seus vinhos em 1995, mas a primeira indicação de procedência brasileira que ocorreu com justíssimo reconhecimento, uma verdadeira coroação, pois está entre as melhores do mundo, veio para o Vale dos Vinhedos no Rio Grande do Sul, somente em 2002.
Essas denominações estão expressas nos rótulos dos melhores vinhos de vários países do mundo. Mas fique atento aos seus significados.
No livro A Experiência do Gosto – O Mundo do Vinho Segundo Jorge Lucki – Editora Companhia das Letras, mais precisamente na página 292, o autor esclarece com maestria: “O importante é que o consumidor saiba que a denominação DOCG, e mais ainda a DOC, ostentada em rótulos de vinho italianos, definitivamente não é garantia de qualidade, mas de procedência. A qualidade de um vinho está associada única e exclusivamente ao potencial do vinhedo, do terroir, e à capacidade, talento e propósito de quem tem a responsabilidade de extrair esses recursos ofertados pela natureza. A bem da verdade, não é diferente na classificação IGT. Aqui, ao menos, o produtor pode interpretar com liberdade o potencial qualitativo oferecido por sua terra… O conselho é se fixar no nome do produtor e, se ele agradar, lhe ser fiel; melhor dizendo, “nome dos produtores”, no plural.”
O grande mestre Ciro Lilla faz sintética e sábia menção ao assunto em seu livro da seguinte forma: “… esse controle garante apenas um padrão mínimo de qualidade e tipicidade”.
Portanto, embora tenha ficado claro que as Denominações de Origem NÃO expressam garantia de qualidade e sim, expressam garantia de procedência, não restam dúvidas que uma parcela de confiabilidade é atribuída à qualidade. Mesmo que seja mínima, mas ao verificarmos uma Denominação de Origem estampada em um determinado rótulo, certa segurança nos é transmitida, não podemos negar.
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